sábado, 25 de setembro de 2010

.Trabalho de desenvolvimento do primeiro capítulo “Art Worlds and Collective Activity” do Livro Art Worlds de Howard Becker (1984)



IT WAS MY practice to be at my table every morning at 5:30 a.m.; and it was also my practice to allow myself no mercy.
An old groom, whose business it was to call me, and to whom I paid £ 5 a year extra for the duty, allowed him self no mercy. During all those years at Waltham Cross he was never once late with the coffee witch it was his duty to bring me. I do not know that I ought not to feel that I owe more to him than to any one else for the success I have had. By beginning at that hour I could complete my literary work before I dressed for breakfast.
ANTHONY TROLLOPE, 1947[1883], P.227



É desta forma que Becker inicia o primeiro capítulo do seu livro Art Worlds, apresentando um pequeno excerto de Trollope que eu tomei a liberdade de reproduzir na integra e de certa maneira de introduzir o meu texto da mesma forma, pois acho que se ele (Becker) lhe deu esta importância também eu a tenho que dar pois acaba por ser um excerto fundamental para o desenvolvimento do capítulo. E porquê? Porque apresenta-nos aqui uma quantidade de informação e questões que vão alimentar o seu discurso de como funciona o “Mundo da Arte”e ou nas suas actividades.
Nesta primeira parte e relacionando agora o meu discurso para o que vem a ser o essencial desta pequena introdução a questão central é a relevância ou não do ajudante de Trollope na construção/finalização da obra de arte neste caso literária, ou seja, será que o facto de o acordar com o café todos os dias às 5:30 da manhã é ou não importante para que a obra ficasse completa e será que essa participação é relevante, ou não, para como a obra de arte se forma? Trollope diz que sim, enquanto Becker afirma que poderia ser feita sem o café mas que não foi esse o caso e sendo assim, ganha relevância.
Esta pequena reflexão serve então de mote para todo o seu discurso sobre as actividades artísticas, que assim como todas as actividades humanas, envolve sempre um certo número ou grupo de pessoas, colaborando umas com as outras e, que é através da cooperação que toda a arte que vemos ganha forma. Essas formas de cooperação podem então ser efémeras ou rotineiras, acredito que até mesmo casuais, e são elas que acabam por produzir os padrões das actividades colectivas a que poderemos chamar Mundo da Arte. Assim a existência de um Mundo da Arte acaba por afectar tanto a produção como o consumo da mesma, e Becker sugere então que se faça uma abordagem sociológica à arte e não uma abordagem crítica, que produz juízos e julgamentos estéticos, pois no seu ponto de vista uma abordagem sociológica ajuda a compreender a complexidade de cooperação das redes de trabalho onde a arte aparece, assim como por exemplo as actividades de Trollope e o seu ajudante se misturam com as de impressores, editores, críticos, leitores, etc., assim como nas redes similares de todas as áreas.
Art as Activity

“Art Worlds and Collective Activity” está dividido em vários subcapítulos onde este “Art as Activity” é o primeiro e onde Becker começa por analisar a quantidade de actividades necessárias para aparecer a obra de arte e identifica-as de uma forma estrutural, ordena-as, mas afirma no final deste primeiro capitulo em género de conclusão do mesmo que, esta organização não é uma teoria funcionalista que sugere que todas as actividades têm de correr dentro dos mesmos parâmetros pois sem elas o sistema não sobrevive.
Analisemos então as actividades a que Becker se refere: em primeiro lugar e para começar, a ideia. É lógico que para se construir uma obra de arte qualquer que ela seja têm que surgir ideias, sobre o que se quer fazer, como se quer fazer, etc. Há ideias, assim como ele afirma, que requerem muito esforço a elaborar, outras menos, há ideias brilhantes, outras mais foscas, algumas decorrem durante o trabalho e outras são pensadas previamente e a sua qualidade não está necessariamente relacionada com a forma de como o trabalho é produzido ou resolvido. Em segundo lugar e como é óbvio para a concepção do projecto, a ideia tem de ser executada, dar forma à ideia. Necessariamente isto pressupõe a construção de algo, a transformação de algo imaginário para algo concreto, físico, apesar de ele afirmar e transcrevo: “Most artistic ideas take some physical form: a film a painting or sculpture, a book, a dance, a something which can be seen, heard, held.”, Mas a meu ver, não a maioria mas todas as ideias têm que ganhar uma forma física para se tornarem obra de arte, pois no meu entendimento não é possível ou ainda não foi possível consagrar só a ideia como obra de arte, haverá sempre que apresentar um registo físico do que foi ou é a ideia e os meios para a execução da mesma, como sabemos, são os mais variados possíveis, desde computadores e impressoras para escrever e imprimir livros a pautas de musica que têm que ser tocadas por músicos, telas e outros variados suportes para pintura etc., afirmo com convicção que dentro do contexto artístico contemporâneo actual, qualquer meio e suporte é valido para representar uma ideia, ou como possível obra de arte. Outra das actividades que ele enuncia é então a criação e distribuição de materiais e equipamento necessários que a maioria das actividades artísticas precisam, como por exemplo instrumentos musicais, tintas e pincéis, câmeras de filmar, etc. Neste campo afirma também que a produção de trabalho artístico demora tempo e a produção dos materiais e equipamentos também; como é sabido tempo é dinheiro e os artistas assim como ele afirma muitas vezes têm que arranjar formas de obter dinheiro, para poderem comprar os materiais que precisam para a construção da sua obra, e dou como exemplos trabalhar paralelamente noutro emprego, arranjar subsídios estatais, governamentais, ou, ter pais ricos!
Outra das actividades enunciadas é o apoio necessário à apresentação da obra de arte como por exemplo no caso do teatro, o apoio aos artistas a montagem do palco e dos cenários, o “backstage”, por assim dizer, e na apresentação da obra, como é claro, é necessário também o público, que tem uma importância caracterizada muito bem por esta frase que o próprio Becker apresenta: “…if a tree falls in the forest and no one hears it, did it make a sound?“, ou seja a actividade de ver, de resposta, tem que ser feita, e neste sentido surgem também os críticos, filósofos e teóricos que suportam o trabalho artístico, criando raciocínios que suportam a existência da obra e a sua pertinência, mostrando ser também uma actividade bastante necessária para o aparecimento e consolidação da obra de arte.
De qualquer das maneiras e pegando agora no meu primeiro paragrafo e em jeito de conclusão deste primeiro subcapítulo, se uma ou outra destas actividades não ocorrerem desta maneira ou não forem feitas, isso não inviabiliza a criação da obra de arte pois acontecerá de outra maneira, naturalmente isso afecta a produção do trabalho que já não será o mesmo, mas é diferente de não existir. Becker da como exemplo os poetas, que dependem de impressores e editores para publicarem e mostrarem o seu trabalho, mas se por alguma razão essas facilidades não estiverem disponíveis o poeta pode sempre recorrer a outras soluções como imprimir e publicar de um modo caseiro, distribuir na rua, ou por amigos, ou até mesmo guardar para si próprio, mas nesse caso o trabalho não será reconhecido ou direi mesmo conhecido e como tal é como se não existisse.

The Divison of Labor

Dadas as circunstâncias acima referidas e a quantidade de actividades necessárias para a criação de uma obra de arte, Becker analisa agora a divisão do trabalho na produção da obra, pois dificilmente conseguimos imaginar uma pessoa que faça todas essas actividades sozinha, porque, todas as artes, assim como todas as actividades humanas que conhecemos, envolvem a cooperação com o outro.
Dá-nos então a pensar em todas essas actividades e a pensar que são feitas por uma pessoa, especialista, que não faz nada mais do que essa única operação, assim como uma divisão de tarefas numa linha de trabalho, fabril, industrial, apresentando-nos como exemplo a produção de um filme de Hollywood onde a lista de créditos é interminável, e onde estão descriminadas todas essas funções, como director de imagem, de fotografia, produtor, argumento, luzes, câmeras, etc., proporcionado neste caso por uma industria megalómana e por uma cultura tradicional que, de certa forma valoriza a carreira cinematográfica dos participantes através da inclusão dos seus nomes nos créditos, mas, o que é certo, é que tiveram a sua importância na construção do mesmo.
Noutras situações a divisão de tarefas varia e tem formas mais tradicionais ou rígidas ou ate mais alargadas e híbridas dependendo também da natureza do meio como exemplifica através da relação entre o compositor e o músico em vários estilos musicais: antigamente as duas actividades ocorriam em separado, ou seja, o compositor compunha e o músico tocava, mas que isso não é de todo verdade (e hoje em dia cada vez mais), pois alguns como Beethoven compunham e interpretavam, muitas vezes também porque ganhava-se mais a tocar ao vivo que a compor as obras. Ao contrário do que acontece no jazz onde por exemplo as obras não tem um compositor fixo ou não se sabem quem compôs tais temas pois as obras muitas delas são de origem “popular” e o que interessa neste caso são os seus interpretes e a sua capacidade de improvisação sobre os temas. No rock as duas actividades geralmente são exercidas pela mesma pessoa ou banda e as actividades são separadas ao contrário do jazz onde composição e performance são simultâneas.
Becker diz então que as mesmas variações de divisão de trabalho podem ser encontradas em qualquer arte, como na fotografia onde alguns fotógrafos fazem as suas próprias impressões enquanto que outros deixam essa tarefa para técnicos especializados. Cada pessoa que participa na produção de obras de arte tem então uma tarefa para fazer e cada arte, assenta sobre uma extensiva divisão de trabalhos. Isso é óbvio no caso das artes performativas como foi acima referido, e Becker pergunta se em relação às artes mais solitárias como a pintura, por exemplo, isso acontece. Considera que sim, pois a divisão de trabalho não requer que as pessoas estejam todas no mesmo espaço de trabalho ou que trabalhem ao mesmo tempo. Simplesmente requer que tenham um envolvimento directo ou indirecto com o trabalho exemplificando que os pintores também dependem de quem faça as tintas, os pincéis, os galeristas, os coleccionadores, os críticos, pois sem eles, sem esse suporte o seu trabalho não faz sentido e nesse caso são participantes activos no trabalho, e na sequencia deste desenvolvimento sobre a produção de obras de arte e da divisão de trabalho apresento um excerto de Manoel de Oliveira no jornal “O Público” na sexta-feira dia 9 de Julho sobre a defesa do cinema português na pagina 41: “Cada um dos nossos filmes move um grupo de actores, outros tantos figurantes, e uma equipa técnica completa. Este conjunto de contratados mexe com transportes, com restaurantes, com hotéis, etc., e toda esta gente com aquilo que ganha faz as mais variadas compras com esses pequenos ganhos do seu trabalho, e isto, para além de dos gastos que as próprias filmagens são obrigadas a fazer para produzir cada um dos seus filmes.” Ora se este grupo move com restaurantes, hotéis, transportes, etc., será que também eles sejam participantes na obra de arte e dividam assim, com os artistas e os técnicos, e os realizadores e os actores, o trabalho de fazer uma obra de arte? Será que eles para poderem participar nisso, como o chefe de um restaurante, não necessite também de empregados, de fornecedores de comida, de produtores de comida? Será que esses intervenientes indirectos também trabalham para construir uma obra de arte? Assim como um homem que esteja numa fábrica a produzir tubos de tinta a óleo não creio que esteja minimamente preocupado para onde vão, quem os vai usar, e se isso será arte ou não! Que participe indirectamente no mundo da arte, sim, mas então eu também participo indirectamente no mundo da medicina, e sendo assim, o mundo da arte será de todos e terá a participação de todos assim como todos são de todos os mundos!


Art and Artists

A conclusão do ultimo capítulo dá-nos uma boa introdução para um novo, onde Becker afirma que ambos os participantes na criação de trabalhos artísticos e os membros da sociedade em geral acreditam que fazer arte é só para alguns, pessoas dotadas de talentos especiais, sentidos ou capacidades que poucos têm! Esses poucos são os denominados “artistas”! Neste sentido pressupõem-se que os artistas “dotados” possam produzir trabalhos de uma sensibilidade e expressão de grande valor para a sociedade e por seu lado acabam por usufruir de privilégios que a sociedade lhes concede, impossíveis para o cidadão comum, de forma a poderem ter a “liberdade” de produzir para a mesma, trabalhos de carácter e valor único, se bem que esta situação só existe basicamente na sociedade ocidental.
Na distinção dos “verdadeiros artistas” a sociedade ocidental criou mecanismos e meios de encontrar e diferenciar os artistas dos não artistas, e Becker apresenta dois extremos, por um lado, academias de aprendizagem intensiva e de longa duração onde existiriam os que teriam licença para exercitar a arte após esse longo processo, onde os estados não permitiriam uma arte muito autónoma e controlariam as instituições e onde os artistas se formavam, limitando o acesso à pratica e ao desenvolvimento de qualidades. Por outro lado, como por exemplo nos Estados Unidos da América, uma politica onde toda a gente poderia aprender e os talentosos seriam distinguidos dos não talentos com base no seu sucesso de mercado ou através de outros mecanismos de controlo mercantil! De qualquer das maneiras em ambos os sistemas as pessoas continuam a ter a ideia de que os artistas têm talentos especiais e as suas actividades, mais raras têm a conotação de actividades ou trabalhos feitos por artistas, artísticos, enquanto que outras, menos raras e com um processo de trabalho diferente e por terem menos características de “arte”, mas na minha opinião não menos valoroso, são tratadas com menos respeito como o artesanato por exemplo, no entanto é provado, como todos sabemos, que ao longo dos tempos o estatuto do que é arte ou artístico foi mudando e hoje em dia no panorama da arte contemporânea não é preciso termos qualidades “artísticas” ou técnicas para sermos bons artistas, e prova disso é a arte conceptual onde muitas vezes a apresentação da proposta já conta como a própria obra, ou como o minimalismo, onde muitas vezes as peças não são feitas pelos chamados artistas.

Para concluir, o domínio de uma técnica de construção ou de um processo para atingir um fim também pode ser considerado uma obra de arte e o seu técnico um artista, como exemplifica Becker em relação aos produtores e misturadores de música, pois a capacidade de o manipular electronicamente os sons começou a ser reconhecida como artística, e mais uma vez entramos no panorama da contemporaneidade onde tudo vale, desde que seja bem explicado. E é neste panorama que vamos continuar após os actos de Marcel Duchamp e o rompimento e criação de um novo género de arte.
A arte contemporânea sustenta-se que tudo pode ser arte e que qualquer um pode ser artista e como prova disso veja-se a iniciativa do Museu Guggenheim e da publicação por concurso de vídeos no site da internet Youtube, para serem exibidos numa das maiores instituições representativas da arte contemporânea no Mundo.

Pedro Oliveira, História das Ideias, 12 de Julho de 2010

Desespero na floresta

Na floresta escura,
Uma mulher só, passeava
O sol já se punha ao longe,
Sobre os pinheiros e os montes repousava!
De repente,
Rápido como uma serpente,
Um belo cipreste abate-se sobre o seu corpo inocente,
E ela grita, desesperadamente:
- Socorro, alguém me ajude!
Só os lobos ouviram!

O jovem revolucionário

Gritei sim,
À revolução!
Há revolução!
Mas de nada me valeu,
O povo unido continuava a ser vencido!
A polícia investiu sobre um pequeno grupo de manifestantes onde eu me encontrava!
Cai morto por uma causa que agora achava,
Perdida!

O Erro

Eucaliptos pastam nas paisagens
Modernas
Junto a vias rápidas, estradas automáticas
Consomem, consomem
Os terrenos férteis agora secos
Onde já nada cresce
Oh! D. Dinis
Que rica ideia a tua
Usar a exploração florestal
Para o bem da nação
Da industria naval
Mas o teu erro foi, não
Te lembrares que estamos em Portugal!

“Toda a vida das sociedades nas quais reinam as condições modernas de produção se anuncia como uma imensa acumulação de espectáculos. Tudo o que era directamente vivido se afastou numa representação.”

Debord, G., 1967, A Sociedade do Espectáculo