terça-feira, 8 de novembro de 2011

"Discurso apresentado no "Debate sobre cultura" que aconteceu na ESAD.CR no dia 24/10/2011"

Antes de mais quero aqui dizer que aceitei participar neste debate sem saber à partida que estava a ser programado por um partido politico, caso soubesse provavelmente não teria aceitado o convite pois desmarco-me do mesmo ideologicamente, e pergunto-me qual influencia partidária no desenvolvimento da cultura.

De qualquer das maneiras é de valorizar a atitude do Alexandre Cunha na organização do debate e só tenho a agradecer o voto de confiança e o convite, porque por outro lado acho irónico estar presente nesta mesa, quando a minha situação escolar ainda não estar resolvida, o que me deixa extremamente feliz.

Neste caso o Bloco de esquerda organizou numa instituição pública (ESAD) um debate sobre a cultura e o seu estado.

A primeira questão que vos ponho tem a ver com a realização de um debate sobre a cultura numa escola de artes do ensino superior organizado e patrocinado por um partido politico e não pela própria instituição, supostamente o maior interessado no assunto, e quais os verdadeiros interesses dos partidos políticos na discussão da cultura?

Se um partido político ou um governo tem um programa cultural assim como tem para a saúde, para os transportes, ou como anda agora na moda para a economia, por exemplo, isto leva-nos a pensar que o programa cultural do país, ou seja a própria definição de cultura de um país seja alterada conforme as opiniões dos políticos e dos partidos que o liderem.

Logo, se for um partido por exemplo de direita, a definição do que para eles deve ser desenvolvido culturalmente no país, varia da de um partido de esquerda.

Assim sendo a politica cultural do pais varia conforme os desejos de quem o lidere, sendo também que os apoios dados às diversas actividades culturais do pais variam da mesma forma. Esta situação faz com que certas áreas da cultura se desenvolvam mais do que outras e esse desenvolvimento esteja sujeito aos critérios de quem está à frente do ministério da cultura e dos departamentos culturais das câmaras municipais e de outras entidades vigentes.

Este sintoma aplica-se também à educação, como a uma escola de artes, por exemplo. Se as pessoas que estão à frente desses órgãos forem simples gestores ou burocratas, preocupados em lidar única e exclusivamente com números, de formas a responder aos seus superiores, eles também, gestores e burocratas, podemos dizer que o serviço é deficiente e que as necessidades dos seus utentes (alunos, por exemplo) não estejam a ser satisfeitas, pois quem está a frente nada percebe do assunto.

Poderemos também dizer que as vertentes culturais mais rentáveis do mercado, como a música ou a literatura, tenham vantagens e privilégios em relação a outras como as artes plásticas ou o teatro, por exemplo.

Outro problema é que se a politica aplicada por quem esta a frente desses órgãos for uma politica de desenvolvimento local, podemos ainda dizer que os produtores locais têm vantagem na obtenção de apoios em relação aos “forasteiros”, independentemente da qualidade pois o único objectivo de quem dá os apoios é fomentar o desenvolvimento regional.

Esta é então uma segunda questão em que penso, por experiencia própria e por, olhando ao meu redor ver que é um problema que existe nesta cidade.

Por exemplo: a maioria dos alunos da ESAD, vem de diversas áreas do país e vejo que é difícil a sua integração na cidade e na população, tanto pela estranheza reaccionária que existe por parte da própria cidade e dos seus habitantes, aos “artistas” e aos “de fora” assim como por um fechamento dos alunos e da escola sobre si próprios.

Acredito que existe infelizmente por parte de quem muitas vezes estuda e vem de fora uma atitude arrogante e de superioridade em relação ao outro, e essa postura acaba por se reflectir nessa recusa do cidadão local e num discurso negativista em relação à própria cidade e às suas instituições.

Assim como existe por parte da população local, um estranheza e um medo do desconhecido, esse medo existe pelo facto de sentirem a sua propriedade ameaçada, e os seus costumes e as suas rotinas alterados perante o “invasor”, e estes pensamentos podem estar na base do fosso que existe entre escola e cidade.

Por outro lado as vezes penso que a cidade está disponível ao apoio de quem vem de fora para desenvolver projectos, mas muitas vezes as pessoas não se querem mexer e lamentam-se que não há apoios.

Ficar sento à espera que as coisas aconteçam não leva a lado nenhum, e acredito que quem realmente quer fazer alguma coisa, faz, com ou sem apoios. A maioria das pessoas que eu conheço neste meio, não vivem da arte, ou da cultura, acredito que a maioria, nunca viverá.

Essas pessoas, das quais eu também faço parte, vivem com outras fontes de rendimento, e se continuam a produzir objectos, ou qualquer outra forma de expressão, muitas vezes sai do seu bolso, e como se costuma dizer, é por amor à camisola.

E de certa maneira ao mexer-me já tive e tenho apoios tanto por parte da câmara das caldas, como participo e desenvolvo projectos, com cidadãos caldenses, assim, como com alunos e ex-alunos da escola, ex-alunos esses que assim como eu foram ficando por aqui.

Também não acho bem que as pessoas não sejam valorizadas pelo seu trabalho e pela qualidade do mesmo, e acho que essa tal maioria, se fosse um mundo justo, viveria só para a cultura. Mas, o mundo não é justo, porque se fosse não haveriam milhões de pessoas a morrer à fome, e alguém se preocupa com isso? Alguém pensa nisso antes ou durante todas as suas boas refeições? Claro que não, não vamos ser hipócritas a esse ponto.

Agora aquilo que penso, é que se cada um de nós fizer um bocadinho, o mundo será um bocadinho melhor, e se tu influenciares a tua rua, a tua rua pode influenciar o teu bairro, o teu bairro a tua cidade, a tua cidade o teu país, etc.

Ao pensar sobre isto e agora para fechar, apresento uma espécie de uma ideia para resolver estes dois pontos.

Acho que os departamentos culturais do país têm que ser independentes dos partidos, dos governos e das câmaras a nível de gestão patrimonial. È lógico que para sobreviver precisará sempre de apoios económicos estatais (e é para isso que também servem os impostos) pois a mais-valia económica que a cultura trará ao país não aparece do dia para a noite, é preciso tempo, é um investimento, como a educação, mais gente formada, mais desenvolvimento, mais trabalho, melhores condições de vida e como a saúde, menos doenças, mais gente sã, melhores condições de vida, etc.

Acho que há vários problemas importantes na cultura em Portugal e um continua a ser ter gente que tem o poder de tomar decisões e que as toma de uma forma errada e sem conhecimento de como as coisas realmente funcionam, afogando muitas vezes à nascença o potencial e a importância no desenvolvimento do país que a cultura tem. Tome-se por exemplo o cinema, quem são os responsáveis pela destruição do cinema português e por quase todas as salas de cinema do país só terem filmes americanos? O Mercado que vende o produto?

A população que muitas vezes não tem acesso a informação e que o seu espírito critico vai sendo anestesiado entre o trabalho e o consumo do que lhes é dado pelos media?

Ou serão as pessoas (supostamente eleitas pelo povo) que estão à frente das instituições e entidades competentes que deveriam ser as primeiras a zelar pelo interesse do desenvolvimento da cultura no país, através da promoção do cinema português em vez da importação constante dos filmes de Hollywood?

Quem determina que os filmes de Hollywood são melhores que os portugueses, quem determina o que é bom e o que é mau?

Quem determina o que é cultura e o que não é?

Serão pessoas que estudaram a história a filosofia e a estética e que sabem distinguir a capacidade que certo tipo de objectos como filmes, peças de teatro, ou musica, têm de por as pessoas a pensar, que distinguem até que ponto esses objectos são profundos e pertinentes, e consequentemente belos e valiosos?

Ou serão políticos e gestores que pensam simplesmente em fazer dinheiro rapidamente e que passado um ano esse dinheiro já se esfumou porque as escolhas que fizeram são modas e interesses económicos, sem qualquer potencial artístico e cultural a longo prazo que enriqueça o país?

Ao mesmo tempo, será que uma pessoa é considerada culta em alguma matéria, ao saber varias especificidades da mesma? Por exemplo, será que um adepto de futebol, pode ser considerado culto por saber o nome dos jogadores todos, o sitio e a data onde nasceram, os jogos dos clubes, etc,?

Será alguém culto, por saber as marcas de roupa todas, e as estações e as modas dos anos x ou y?

Assim como será alguém culto por saber o nome dos artistas todos da história e o que fizeram?

Caso sim, Qual a diferença para distinguir os vários níveis de cultura e o que deve ser desenvolvido a nível cultural no país se as pessoas que gerem esses departamentos não são aptas para fazer tais distinções? E se a própria população se contenta com a “cultura” que tem e não procura nada de novo?

Na televisão, a percentagem de pessoas que vê RTP2 é mínima em relação à SIC ou TVI, por exemplo, e toda a gente sabe que o negócio televisivo é alimentado por audiências. As pessoas podem escolher a RTP2, mas não o fazem. Será que a culpa é dos programadores televisivos ou do próprio espectador que não quer pura e simplesmente ver “diferente”? Sair da rotina? Aborrecer-se?

Por outro lado vejo que no telejornal, temos todos os dias 20 minutos de futebol, e penso que se em vez de 20 minutos de futebol tivéssemos 20 minutos de agenda cultural do país, num curto espaço de tempo as opiniões e os interesses das pessoas iam mudando, porque acredito que também sejam precisos estímulos.

Mas de certa forma é mais importante para quem as gere, o valor das audiências do que o desenvolvimento do país.

Em relação aos privados nada tenho a objectar pois fazem o que querem mas em relação à televisão do estado já me pergunto qual o papel que ela poderia ter no desenvolvimento da cultura do país? Mas já tem um canal alternativo e gratuito visto por uma minoria!

Esta alienação por parte da maioria da população é um facto, nas caldas assim como em quase todas as cidades do país apenas uma minoria dos seus habitantes vai a exposições e outro tipo de eventos culturais (como disse a pouco), e cabe tanto aos produtores culturais como aqueles que estão em frente das instituições tentarem pouco a pouco, trazer mais espectadores aos acontecimentos.

Nesta cidade, são sempre os mesmos que vejo nas exposições, por exemplo, a maioria dos espectadores acabam por ser eles próprios produtores, e funciona quase como mostra entre amigos, pois poucos mais são os interessados.

Neste sentido e sabendo aquilo que é feito por quem produz, cabe saber o que é feito pelas instituições para alterar esta situação.

E cabe a vocês espectadores, tomarem também uma atitude e deixarem de ficar em casa a jogar computador, ou a falar no facebook, ou a ver novelas, cabe também a vocês, saírem à rua, para ver e fazer acontecer a cultura.

A rua é um espaço de todos e é onde acontecem as coisas. Como querem saber se há uma exposição se quando caminham olham para o chão, em vez de olharem em redor, como querem saber o que se passa à vossa volta, o que acontece, quando caminham virados para vocês mesmos.

Por mais culpas que possa apontar aos políticos e governantes deste país pelos problemas existentes a nível de apoios e verbas para a cultura acho sinceramente que os maiores culpados somos nós mesmos, por muitas vezes não abrirmos espaço na nossa mente para o que acontece à nossa volta, pela embriaguez em que vivemos diariamente, pela abstenção critica e pela nossa inércia em fazer algo.

Simplesmente vivemos as nossas vidas olhando para os nossos umbigos, e que alguém há-de fazer o resto! É esta a questão que eu vos deixo, fazem alguma coisa para mudar o mundo à vossa volta?


Pedro Oliveira

24 de Outubro de 2011

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Resumo e Análise da obra “A morte do autor” de Roland Barthes

Roland Barthes começa por nos intruduzir ao pensamento da morte do autor atraves de Balzac, dando o exemplo que na novela Sarrasine, Balzac utiliza um castrado disfarçado de mulher e escreve acerca do mesmo “era a mulher, com os seus medos subditos, os seus caprichos sem razao, as suas perturbaçoes instintivas, as suas audacias sem causa, as suas brabatas e a sua deliciosa delicadeza de sentimentos.”, questionando depois se quem fala assim é Balzac e a sua experiencia pessoal de uma filosofia de mulher, o heroi da novela ignorando o castrado que se esconde sob a mesma, ou o autor Balzac pensando ideias literarias sobre a mulher? Barthes afirma que é impossivel sabe-lo porque a escrita é a destuiçao de toda a voz, de toda a origem. Diz entao que a escrita é esse neutro, onde vem perder-se toda a identidade começando logo pelo corpo que escreve. Assim sendo e neste sentido a escrita torna-se independente do sujeito que escreve, do autor.
Ora Barthes diz-nos que sempre foi assim e que, desde o momento em que um facto é contado e não age directamente sobre o real, fora de qualquer função que não seja exercer-se como simbolo, que produz esta diferença, a voz perde a sua origem, o autor desaparece (morre) e a escrita começa. Diz-nos tambem que o sentimento deste acontecimento varia, nomeadamente consoante o tipo de sociedade, exemplificando que numa sociedade etnografica o que se pode admirar é a qualidade de prestaçao de um orador, mas nunca o seu genio, pois o orador, é simplesmente um mediador e nunca o criador de uma narrativa. A ideia de autor, surge so na sociedade moderna, pois atraves do empirismo ingles, o racionalismo frances e a fe pessoal da reforma veio descobrir-se e valorizar-se o indivíduo e o seu valor pessoal. Neste sentido afirma que é logico que na literatura o positivismo resultante da ideologia capitalista tenha concedido maior importancia à pessoa/autor. Isto porque e segundo Barthes existe uma valorizaçao da vida e obra do individuo, e a imagem da literatura corrente é centrada no autor, e na sua pessoa, valorizando-se assim os seus gostos e historia de vida como forma para valorizar o seu trabalho exemplificando com a loucura de van gogh, o falhanço do homem Baudelaire ou o vicio de Tchaikowski, tentando sempre encontrar-se explicaçoes para a obra do ponto de vista de quem a produziu, e desta forma, de uma maneira biografica, relacionar toda a sua produção.
Barthes vem agora num novo parágrafo dar alguns exemplos de autores que tentaram combater esse “império do autor”. Começando por Mallarmé, afirma ele (Barthes) ter sido o primeiro ao ver a necessidade de dar à linguagem a propriedade da expressão e da fala, retirando-a do autor; dizendo que toda a poética de Mallarmé consiste na supressão do autor em proveito da própria escrita e da restituição do seu lugar junto do leitor, através da procura do ponto onde a linguagem actua e “performa” em substituição do “eu”, tornando-a assim impossível de confundir com a “objectividade castradora do romancista realista”. Outro escritor que Barthes usa como exemplo é Valéry, que envolvido com a psicologia do eu, vem pegar na teoria de Mallarmé, para explorar e por em dúvida o Autor, através da condição essencial do verbo na literatura, ao qual “qualquer recurso à interioridade do escritor lhe parecia pura superstição”. Barthes vem também e logo de seguida neste desenvolvimento quase cronológico enunciar Proust como exemplo seguinte, apresentando a ideia de que Proust : “ao fazer de narrador, não aquele que viu ou sentiu, nem sequer aquele que escreve, mas aquele que vai escrever (o jovem do romance – mas, afinal, que idade tem ele, e quem é ele? – quer escrever, mas não pode, e o romance termina quando finalmente a escrita se torna possível) ” vem confundir de uma forma extrema a relação entre o escritor e as suas personagens e desta maneira inverte radicalmente a noção de romance, pois em vez de por a sua vida no seu romance, fez dela a sua própria obra. Para concluir esta introdução ao pensamento de autores que combateram o “império do Autor” Barthes vem agora introduzir-nos a ideia do pensamento surrealista que não poderia dar à linguagem um lugar soberano, pois como Barthes diz: “a linguagem é sistema, uma subversão directa dos códigos – aliás ilusória, porque um código não se pode destruir apenas podemos «jogá-lo» ” e como é lógico o Surrealismo ao recomendar sem fim a ilusão brusca dos sentidos e “ao confiar à mão a preocupação de escrever tão depressa quanto a cabeça ignora”, a escrita automática em suma, e ao aceitar a experiencia de uma escrita feita por vários autores ao mesmo tempo, veio ele próprio contribuir de certa maneira para a destruição desses códigos e assim combater o conceito de autor vigente naquela altura. Desta maneira Barthes chega à conclusão deste segundo parágrafo do texto com a afirmação de que a linguística vem fornecer um instrumento de análise precioso na destruição do autor, mostrando que a enunciação é um processo vazio que funciona na perfeição, sem a necessidade de interlocutores, e que linguisticamente o autor é somente aquele que escreve, sendo simplesmente aquele que diz “eu”, ou seja, a linguagem acaba por conhecer um “sujeito”, não uma “pessoa”, e que esse “sujeito”, fora do que o define, é suficiente para esgotar a própria linguagem.
Neste novo parágrafo Barthes apresenta-nos uma questão que compreende o Autor e o seu afastamento cada vez maior em relação à cena literária, dizendo que esse afastamento não é só um facto histórico ou um acto da própria escrita mas também uma relação temporal entre o acto de escrever, a experiencia do autor e o texto em si. Diz então que “o Autor, quando se acredita nele, é sempre concebido como o passado do seu próprio livro”, supondo que o Autor alimenta o livro, através da existência antes dele e do acto de pensar, sofrer e viver com o mesmo, cria uma relação de antecedência semelhante à de um pai com um filho. Ora este tipo de acontecimento segundo Barthes deixa de acontecer no escritor moderno, que nasce ao mesmo tempo que o seu próprio livro, e que não é de maneira nenhuma o sujeito passado do seu livro, e que para o escritor moderno não existe outro tempo que não o aqui e agora. Diz também que escrever já não se pode considerar uma operação de registo, como acontecia com os clássicos, que acreditavam que a mão era demasiado lenta para acompanhar o seu pensamento ou voz e que por isso acentuavam a necessidade de trabalhar sobre a forma do texto, mas sim um acto performativo, ou seja o próprio acto de escrever em si, a sua mão, desligada da voz, simplesmente escreve através do gesto, este acto, por seu lado não tem origem para lá da linguagem, pondo desta maneira em causa, toda a origem.
Desta maneira o texto, segundo Barthes, já não tem em si um sentido único professado pelo seu Autor mas sim um espaço de múltiplas dimensões onde se escrevem e contestam coisas variadas, sem nenhuma delas ser original, tornando-se assim num campo de múltiplas citações saídas do nosso mundo cultural. Através do exemplo de Bouvard e Pécuchet, Barthes afirma que “o escritor não pode deixar de imitar um gesto sempre anterior, nunca original; o seu único poder é o de misturas as escritas, de as contrariar umas às outras, de modo a nunca se apoiar em nenhuma delas,” e que o que tenta traduzir ao exprimir-se “não passa de um dicionário totalmente composto, cujas palavras só podem explicar-se através de outras palavras…”. Assim o escritor já não tem em si paixões, humores ou sentimentos mas sim um imenso dicionário onde pode ir buscar uma escrita que não pode parar, sendo o livro: um “tecido de signos, imitação perdida, infinitamente recuada.”.
Com esta conclusão Barthes afasta de todo, o autor do texto, e afirma que com o autor afastado decifrar o texto tornasse escusado, inútil, sendo que ao dar um Autor a um texto estamos a dar-lhe um último e único significado, fechando a escrita. Conveniente à critica que desta forma pretende descobrir o Autor através da sua obra, sendo que ao explicar o texto o critico vence, colmatando o facto Barthes afirma “…historicamente, o reino do Autor ter sido também o do Critico…”. Ora para Barthes na escrita moderna tudo está por descobrir, a estrutura pode ser seguida ou apanhada, mas que não tem fundo, percorrendo-se todo o espaço da escrita, que por si só faz sempre sentido, mas também, que se vai sempre evaporando, isentando-a sempre de sentido, e desta forma, ao recusar fechar o texto a um único sentido, liberta a actividade de escrever a um único fim ou sentido, assim torna-se contra-teológica, como diz, recusando Deus, razão, ciência e lei.
Voltando a Balzac, Barthes afirma que nenhuma pessoa disse aquela frase, logo que o seu lugar de origem não é a escrita mas sim a leitura. Através do exemplo das investigações de Vernant, Barthes diz que na natureza da tragédia grega o texto é construído sempre com um duplo sentido e que cada personagem apenas compreende um dos lados, neste sentido é este mal-entendido que cria o trágico, e que existe alguém que entende o sentido duplo de cada palavra, e que assim entende também a surdez de cada personagem, e esse alguém é o espectador / leitor. É desta maneira que para Barthes se compreende e revela o total da escrita, o local onde todas as multiplicidades do texto se reúnem não é o Autor do texto mas sim, o seu leitor e que os clássicos nunca se preocuparam com mais ninguém a não ser com que escreve, ou seja, com o autor, e propõe que para a devolver à escrita a sua qualidade é preciso acabar ou inverter esse mito. Sendo assim Barthes conclui afirmando que “ o nascimento do leitor tem de pagar-se com a morte do Autor.”

Podemos agora pensar que estas ideias de Barthes não se apliquem só à escrita mas também a todo o universo das artes, ou seja, que por exemplo uma pintura se torne autónoma e independente do seu criador desde o momento em que é exposta e que cada espectador ou leitor da mesma terá uma interpretação singular da obra. Assim a pintura e o que ela representa pertencem a quem a observa e sente e não a quem a criou. De qualquer das maneiras não será o facto de essa obra ser apresentada como arte que a liberta de todas essas imposições e ao mesmo tempo não será o facto de ser arte que a liga ainda mais intimamente ao seu Autor e ao valor que adquire por ter sido criada por ele? Warhol ao criar as suas serigrafias de certa forma potencia e vem afirmar que o acto de criação de arte pode ser feito por qualquer um, pois é um processo facil reprodutível, mas por outro lado criava erros através de uma prévia aplicação de tinta na tela, erros estes que contribuíam para que cada das suas peças fosse única, acentuando e aumentando assim o seu valor de mercado. A meu ver Barthes não apresenta muitas questões relacionadas com o valor de mercado de uma obra, mas acredito que é a existência do mesmo que cria este problema e que é também por esta razão que surge o crítico, para confirmar e valorizar a obra de um certo Autor e assim, decidir o que é valido ou não de entrar nesse mercado, baseado em parâmetros de experiencia, estética e potencial de resposta do Autor relativamente às necessidades do mercado. Ora para finalizar a obra aberta ou a morte do Autor em favor do nascimento do leitor, que Barthes fala, em que o espectador tem de certa forma a leitura final sobre uma obra vem combater estas ideias acima apresentadas, e é nesse aspecto que nos encontramos, basta ficarmos à espera para saber qual é o resultado, se vence o capitalismo e os valores de mercado, ou se vence o interesse humano na liberdade de criação e leitura da arte.





Pedro Oliveira
23 de Março de 2010

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Cronica: "Mais um dia" - para Prego Zine

Acordei tarde hoje, ao abrir os estores para entrar alguma claridade no meu quarto desarrumado, o sol já brilhava alto no céu, feria-me a vista, ainda habituada `a escuridão. Vesti as primeiras peças de roupa que apanhei pelo caminho e pus-me na rua, numa tentativa atabalhoada de aproveitar o resto do dia, visto que a manha já tinha ido toda com o caralho. Uma vontade de punk rock inundava-me as veias, apetecia-me correr, gritar, violar, sentir a música rápida e veloz, com aquelas palavras de ordem simples e objectivas, chocalhar-me a cabeça e urrar ao sol, berrar tudo de uma vez. Como e´ normal, nada disso aconteceu, sai, tranquilo e controlado em passo ligeiramente acelerado e balançante pelas ruas da cidade em direcção ao café do costume, numa de encontrar alguém com quem pudesse conversar um bocado e expressar as minhas ideias, no fundo, só procurava companhia, uma alma que me acolhesse e ouvisse, egoísta como sou, normalmente tenho este tipo de comportamentos, procuro simplesmente alguém que me ouça, mesmo que não tenha nada de jeito pra dizer e esqueço-me que essas pessoas também precisam de quem as ouça. E´ engraçado com `as vezes damos por nós a falar merda e faltamos ao respeito `aquele que nos ouve, estamo-nos mesmo a cagar pra opinião dele, nem sequer pensamos nisso, simplesmente não pensamos nada, só dizemos merda, lixo, conversas de merda, fúteis, vazias, ocas. De certa maneira apenas queremos esvaziar um pouco das nossas mágoas e frustrações, a negritude que nos vem dentro da alma, diria mesmo, que nos atormenta a alma, que nos faz pensar o porquê de vivermos, de continuarmos com esta rotina, de continuarmos, incessantemente a insistir em respirar e em viver de forma igual todos os dias. Acabamos por nos enganarmos a nós próprios, acreditando, que a partir de hoje tudo há-de ser diferente, decididos em mudarmos de vida, e e´ assim todos os dias, nunca estamos bem com o que temos, e queremos mostrar isso a alguém, descarregar querer acreditar que o amanha será melhor. O café estava vazio de caras conhecidas, não encontrei ninguém, fiquei a tomar o meu café, simplesmente acompanhado pelo fumo dos cigarros que fumava e pelas letras gordas do jornal sensacionalista que tinha pousado sobre a mesa. A merda continua!

Pedro Oliveira
Abril de 2011

Cronica: "Facadas" - para Enfarte Zine

Soube no outro dia que o meu vizinho do sexto andar, ah, e devo desde já avisar-te que vivo num prédio de quinze andares, com seis casas por andar, uma mera curiosidade que pode parecer irrelevante para esta nossa conversa, ou melhor, para aquilo que te estava a contar, mas que apresenta bem o problema do encaixotamento dos subúrbios da grande cidade e que de certa forma também serve para reflectir sobre esta nossa sociedade, onde as pessoas e as famílias vivem encavalitadas umas nas outras, presas à vida do trabalho casa e do casa trabalho, sociedade esta cada vez mais virada para o consumo. Problema este o do capitalismo pós-moderno que tem vindo a desrespeitar valores e morais, se bem que de certa parte, ache que os valorzinhos e moraizinhas bem enraizados pela grande velha gorda devam ser desrespeitados, mas há coisas que chegam ao cúmulo, e para mim, o desenfreado consumismo, causa capital, é um deles, quer concordes ou não, embora eu, irremediavelmente o pratique, e aí, contradigo-me, mas, é assim a vida, cheia de contradições!
Ora, de qualquer das maneiras, estava-te a dizer que o meu vizinho do sexto andar esfaqueou violentamente a mulher, como se de um naco de carne de porco se tratasse, como se fosse um saco de boxe onde o pugilista descarrega todos os seus golpes, incessantemente, cheio de fúria, ate à exaustão. Isto aconteceu porque ela queria divorcia-se dele, isto segundo a história que eu ouvi contar pela parte da minha mãezinha que, sendo a conhecida enfermeira do prédio, Dona Clara se prontificou logo a contar-me num desses inúmeros fins-de-semana que lá vou passar. Como é lógico não vou julgar ninguém… acho que hoje em dia cada um faz o que quer, mas esfaquear a mulher! Se ela se quer divorciar, que se foda, divorcio-me, agora esfaqueá-la? Quase até à morte! Arrependeu-se! Se bem que às vezes também me dá vontade de matar, ou agredir alguém, esfaquear, espancar, esventrar violentamente, dar murros e pontapés, cabeçadas e dentadas a certas e determinadas pessoas, só que…vamos ser racionais, não é?
Pois é, o meu vizinho após o acto arrependeu-se! Ligou para o 112 e chamou uma ambulância para a vir socorrer!





Pedro Oliveira
Fevereiro de 2011

“Toda a vida das sociedades nas quais reinam as condições modernas de produção se anuncia como uma imensa acumulação de espectáculos. Tudo o que era directamente vivido se afastou numa representação.”

Debord, G., 1967, A Sociedade do Espectáculo